Editorial (Número cinquenta)


(J)



Editorial (Número 50)


Este é o Último Número. Aqui começa e aqui começa a terminar. A simples/complexa intenção não é nada mais do que a juntar talentos poetasescritoresdesenhistascaricaturistas. Entrevistas também entrarão e serão bem-vindas. Publicação (até agora) em português mas que não deixa de ver o que rola por este mundo louco. Pois já começamos globalizados, com colaboradores além-mar; e também brasileiros de várias paragens do país.

Este é o Último Número, e que acabe sempre pra se reinventar.


Sérgio Ferrari & Fernando Niero
Organizadores

Conteúdo da edição 50:

Regis Ribeiro: Escute este texto
Carollina Laureano- Crônicas de uma vida (quase) moderna.
Giancarlo Rufatto- Gostar de música pop é um problema
Paulo Trani:a vida em um supermercado
Fernanda Grabauska: Sem Título
Natasha Pinto- Rabisco
Entrevistão: Bazar Pamplona (São Paulo)
Entrevistona: Dylan Mondegreen(Noruega)

Expediente:
Organizadores: Fernando Niero e Sérgio Ferrari (São Paulo)

Ilustrações de fundo: Ulla Saar (Tallin, Estonia)

Projeto Gráfico: Carolina Laureano e Sérgio Ferrari

Charge: J. (São Paulo)

Textos: Fernanda Grabauska(Porto Alegre/Rs),Fernando Niero, Paulo Trani, Carollina Laureano (Sp),Giancarlo Rufatto (Curitiba/Pr)Natasha Pinto (Rio de Janeiro/Rj)

Photos internas: Nelly Moretzsohn

Estágiarios: Lillian de Munno,Eduardo Nascimento, Bárbara Scarambone (Sp)

Sugestões, dúvidas e pra mandar seu texto (sim, pode mandar, você pode ser públicado mesmo sem indicação da empresa) oultimonumero@hotmail.com

ou mande sua carta para: Fernando Niero- Rua Matheus Bariani, 97, Jardim Guadalupe, São Paulo Cep 06026140

Natasha Pinto- Rabisco

Aí eu olhei para o céu e vi. Era uma nuvem tão clara e não era só clara, só branca, era diferente; não, não sei como, era simples e puramente diferente das demais. E eu já não sei se falo besteira, se existem várias nuvens ou se é tudo uma grande nuvem no céu, dispersa, não sei, e isso importa? Houve um momento em que me dei conta, me aproximei para analisar, enxergar melhor e sim, tive a absoluta certeza: se tratava de uma pintura. O céu havia sido pintado, traços tão finos que quase imperceptíveis, tamanha delicadeza e tamanha ousadia, quem se atreveria a pintar o céu? E aí vi o nome do maldito assinado lá no canto, lá embaixo, senti ódio, desgraçado, decidiu por si só e meteu o pincel no meu céu, no nosso céu, no céu de todos. Subi no parapeito da janela e com uma das mãos alcancei a nuvem - ou uma delas, não sei, me sinto confusa quando devo determinar se a nuvem é única ou não. Agarrei com toda a minha ira, se a nuvem fosse balão eu certamente a teria furado com as unhas, mas isso não aconteceu; na minha mão tinta e no céu tinta e por todo lado tinta. Borrei o céu. Confesso que até me arrependi por uns minutos, aquele céu tão puro e tão claro e tão bonito e agora tão borrado, confuso. Aí eu disse bem alto pra ninguém, eu disse que não, que não iria deixar isso barato, e depois eu chorei. Me olhei no espelho. Derreti.

Giancarlo Rufatto- Gostar de música pop é um problema

Gostar de música pop é um problema. Se você tiver lido o romance “Alta Fidelidade” do escritor inglês Nick Hornby, ou mesmo se você conhecer alguém que tenha lido ou assistido o filme homônimo, provavelmente já conheça a frase: “o que veio primeiro a tristeza ou a música pop? Sou triste porque ouço música pop ou ouço música pop porque sou triste?”. Gostar de música pop não é fácil, envolve muito sacrifício e alguma devoção do seu tempo, tanto que costumo associar o tempo que ficamos envolvidos com uma canção que gostamos, com o tempo que perdemos tentando achar a pessoa certa(tudo bem, eu sei que sou bom em generalizar).
Sim, como as mulheres (no meu caso, que pode não ser o seu lado da história), as canções funcionam para o bem e para o mal. Ambas possuem a capacidade de deixa-lo eufórico e saltitante como uma canção do Franz Ferdinand ou melancólico e perturbado como um Radiohead tocando no seu peito.

Basicamente, é impossível ser imparcial em se tratando de música, não adianta tentar ser o mais cético e superficial ouvinte do planeta, a menos é claro que você seja um andróide saído de alguma cena de Blade Runner e não possua um coração. Para todos os outros a musica ocupará alguma cadeira cativa, bem ali entre o primeiro beijo, o primeiro amor e a primeira decepção.
Como vocês sabem existem tantos tipinhos diferentes de seres que ouvem musica, tanto quanto existem rótulos e estilos musicais para dividi-los e subdividi-los, mas vejamos alguns:

Existem aqueles cuja música sempre esteve ali no fundo, o que aconteceu é que eles nunca foram apresentados, não há aquele romance, olhos fechados ou um ou outro suspiro emocionável, em termos genérico é o que a radio fez com as pessoas, acabou com o senso e a capacidade de se emocionar sendo surpreendido ouvindo uma musica, mas pode ser também que esta pessoa nunca tenha ficado um dia sequer sozinha em toda a sua vida e, portanto tenha uma vida perfeita e sem problemas, o que justificaria o desapego a canções sobre pessoas que sofrem mais que você.

Na contra mão destes, há aqueles que destinam algumas horas do seu dia e possivelmente alguns quartos de anos da sua vida a escutar alguém cantando sobre como esta infeliz depois que seu “prête” se foi ou como a vida era boa enquanto eles estavam juntos. Esses gêneros humanos em escassez nos tempos modernos, ainda gastam algum dinheiro (pouco) em discos, embora agora, passem muito mais tempo garimpando bandas obscuras via internet do que em sebos empoeirados em busca de algum vinil do the smiths, mas sim eles ainda existem.

No meio destes dois, os insensíveis e os emocionados, está a maioria da população, entre estes está a sua prima (aposto que hoje ela nutre alguma vergonha dos discos da legião urbana que ganhou do ex-namorado), os seus vizinhos, o seu tio (aquele que já teve discos do creedence, do the doors e até Stones, mas atualmente ouve música sertaneja) e possivelmente até a sua mãe. Música ainda pode ser algo de valor para estas, basta perguntar pra sua mãe sobre sua adolescência, ou mesmo colocar um disco dos Beatles pra tocar e ela lhe contará algo sobre um baile ou algum artista que ela adorava na infância. Eles já amaram ao som de algum pop sintético (bandinhas eletrônicas dos anos 80), ou alguma balada adocicada dos Beegees, quer um exemplo? Coloque “baby, i love your way” de um cara chamado Peter Framptom perto da sua tia pra você ver o que acontece. Eles já foram apaixonados por musica, mas hoje ouvem a musica da novela, ou da FM, não porque perderam o tesão por ouvir uma canção de peito aberto, mas talvez porque agora, não tenham mais tempo pra perder com meninos e suas desilusões adolescentes.

Vamos encarar desta forma: passar uma grande parte da vida falando de música pop pode ser uma maneira bonitinha de conservar os ternos sentimentos da juventude, de continuar sonhando com sensações perfeitas, pelo menos nos três ou quatro minutos que a canção estiver nos ouvidos. Talvez uma desculpa pra continuar pulando de romance pra romance sempre que alguma duvida aparecer, e então poderemos culpar a música pop, afinal assim como as discussões sobre o gosto musical alheio, as relações também são carregadas de alguma crueldade e de uma ironia que nos permitimos usar, quando se tratando de estabelecer alguma defesa ou algum poder sobre alguém. E com certeza enquanto as pessoas continuarem saindo de casa, conhecendo gente e se apaixonando, ainda existirão cobertores, discos e corações partidos, e a música pop estará por ai fazendo suas vitimas.



*Para entender:

Alta Fidelidade: conta a historia de um dono de uma loja de discos obcecado por listas “top 5”, que após ser deixado por sua mulher, resolve enumerar suas maiores decepções amorosas. No Brasil o culto a esse romance gerou a peça de teatro “A vida é Cheia de Som e fúria”, uma das peças independentes de maior sucesso no Brasil.


Nick Hornby: vários de seus romances viraram filmes, além do citado “Alta Fidelidade” (high fidelity, Rocco, 1998), “Um Grande Garoto” (About The Boy, Rocco, 2000) e “amor em jogo” (Fever Pitch, Rocco, 1995) viraram filmes divertidos, mas são um tanto diferentes dos livros.

Franz Ferdinand: se você não ouviu “take me out” e “this fire” ou esteve em júpiter entre os anos de 2004 e 2005, lamento te avisar, mas você perdeu uma grande chance de se divertir e dançar até se acabar.

Radiohead: “fake plastic trees” (foi trilha de comercial no Brasil) e “high and dry”, canções do maravilhoso “the bends” (1995) já completaram dez anos e continuam clássicos da melancolia pop. “ok computer” foi disco do ano de 1997 e está entre os cinco melhores discos da década de noventa. A banda é uma ilha de inovação musical, assustando o mundo pop cada vez que lança um disco novo. Com certeza você já ouviu muito e talvez nem saiba.

Blade Runner, o caçador de andróides (1982): clássico dos anos oitenta sobre o futuro cosmopolita e tremendamente assustador. É aquele filme que o Harrison Ford (o Indiana Jones) é um ex-policial que tem de caçar andróides, no filme chamados de replicantes. Você viu quando era criança e, portanto não lembra, mas a globo passava o filme até na sessão da tarde.

Prête: gíria moderninha pra definir um possível namorinho ou alguém que você anda “pegando” (vamos definir uma gíria usando outra gíria só pra ficar divertido). Se você já leu o zine e coluna da folha 02 neurônio, sabe que elas usam a gíria pelo menos um milhão de vezes por texto.

The Smiths: ligue o radio e espere um pouco e pronto. São grandes as chances de você ouvir “big mouth strikes again” ou “the boy with torn in his side”, hinos desta adorável banda dos anos oitenta. “Queen is Dead”, talvez o disco mais famoso da banda, completou 20 anos de lançamento e é grande a expectativa sobre a possível vinda de morrissey, ex-vocalista da banda, ao Brasil este ano, inclusive tocando em Curitiba.

Baby, i love your way: Peter “Framptom comes alive” é uma praga, o disco ao vivo mais vendido da historia (e figurinha fácil de se achar nos sebos) ainda toca até em rádios AM pelo mundo afora e esta canção citada (teve até uma bizarra versão em português de um cara que participou da casa dos artistas, não me perguntem o nome) faz a alegria de qualquer dona de casa que tenha sido adolescente no final dos anos 70.


Giancarlo Rufatto toca na banda Móbiles,é Publicitário,vive na terra do Leminski e não sabe brincar.

Fernanda Grabauska- Sem Título


(photo: Nelly Moretzsohn)




Me sinto cada vez menor em um lugar que não é meu e também fica cada vez menor pra mim. Esta cidade é tão absurdamente grande e linda, eu fico até sem palavras em relação ao pouco que eu conheço dela e dos seus habitantes, como o pouco que eu conheço se repete dia após dia.

Sempre as mesmas pessoas nos mesmos lugares, as mesmas ruas com nomes de gente que eu não conheço (aposto que o General Lima e Silva deve ter sido um grande cara). O mesmo quarto com lembranças escancaradas para quem quiser vê-las, sempre a mesma vista deste rio que ninguém sabe se faz bem ou mal à cidade. As mesmas pessoas com as mesmas roupas. Uma cidade pode ser surpreendentemente uniforme, com um desfile de menininhas vulgares com a face torrada de sol, velhas andando cabisbaixas como se quisessem invisibilidade e homens suando no verão ingrato característico de Porto Alegre.

Eu sinto que talvez não seja minha essa cidade. Nem esse quarto ou esse apartamento excessivamente mobiliado. Mas o fato de não serem meus não impede que eu tire o máximo deles. Assim como dessa gente de Porto Alegre, que não é minha gente, mas de quem se pode extrair lições de vida absurdas. Esse mundo não é meu, e eu penso que, mesmo socada nesse apartamento na zona rural de porto alegre, eu estou nele para aprender até que faça desse mundo o meu mundo.

Fernanda Grabauska tem 16 anos, mora em Porto Alegre e tem esse simpático sobrenome lituano

Entrevistona- Dylan Mondegreen (Noruega)


Por Fernando Niero


O Norueguês Børge Sildnes escolheu o codinome "Dylan Mondegreen" para mostrar ao mundo suas canções delicadas com forte sabor acústico. Børge cedeu uma entrevista esclusivíssima para "O Último Número" (a primeira publicação de lingua portuguesa a entrevista-lo)

Por que Dylan Mondegreen?

Eu queria um nome de banda, mesmo esse projeto sendo apenas meu, e acabei com um nome que pode ser interpretado como um nome de pessoa.Mondegreen é um termo inglês para letras "que as pessoas entendem errado" - como quando você pensa que o artista está cantando algo diferente do que realmente é.Se você procurar na net, verá vários sites dedicados à "bob dylan mondegreen". Eu acho que o termo diz que seu amor pela melodia ou letra de uma canção não necessariamente uma explicação racional. Comes down to, a melhor musica pop nao precisa ser analisada desta maneira pelo seu coração, for instance, anos atrás eu pensava que Paddy MacAloon cantava "Albuquerque" e não "I Want Cookies" na canção "The King of Rock and Roll" do Prefab Sprout. Você não precisa entender tudo tudo desde que goste do que ouve, desta maneira, Dylan Mondegreen funciona da seguinte maneira: poucos entendem o que realmente significa, mas muitas pessoas irão achar que soa bem


-Quando começou a tocar compor e porquê?

Compus minha primeira canção aos dez anos, só sabia tocar 3 acordes de guitarra e tinha acabado de começar a aprender inglês, a canção se chamava Summertime. Quando comecei a aprender violão, sabia que era iria compor, achava mais interessante escrever canções do que as técnicas tradicionais para praticar violão.Não dava importancia ao fato de compor até chegar aos 16 (acho). Desde então, tem sido minha obsessão achar aquela melodia nova e combiná-la com a sonhada letra com substância o suficiente para fazê-la interessante na longa jornada. Nunca sonhei em ser pop star e acho que isso me ajudou a focar na criação musical. Gosto de ouvir de me ouvir.


Influências?


Eu raramente sou diretamente influenciado por outros artistas, e meu estilo não mudou muito desde quando comecei a compor. Eu sempre tive uma idéia sólida de como minha música deveria soar. Mas claro que, sendo um fã de música, seria ingênuo pensar que não sou influenciado pelo que ouço de algum modo, mesmo que subliminarmente. Alguns de meus preferidos de todos os tempos são: Burt Bacharach, Chet Baker, The Smiths, Nick Drake, Antonio Carlos Jobim e Astrud Gilberto.


Como é ser músico na Noruega? Como está a cena lá?


Bem, é dificil ganhar a vida como músico na Noruega se você não vende discos no estrangeiro. Produzir boa música custa dinheiro e a Noruega é um pequeno país, então é dificil ganhar dinheiro com a venda de albuns. Mas somos privilegiados por ganhar uma ajuda do governo ao saírmos em turnê ou mesmo para gravar. Há bandas boas, mas eu penso que os Artistas noruegueses deveriam focar mais no que poderia fazer entra-los no mercado internacional. Eu não entendo a obessão da impressa especializada em música em encontrar a nova cena do R'n'B norueguês ou do hip hop


"Broken French" é uma história real?


Não, não é uma história real, mas eu tive a ideia da letra durante minhas férias na França ano passado, como não falo francês, começei a fazer brincadeiras com o termo "Broken French" ["francês ruim"] como "with promisses as my broken french". Eu acho que é antes uma história triste de amor sobre a falta de comunicação num relacionamento.


Que tens ouvido ultimamente?


Exatamente agora, o novo album do The Sea and Cake, também tornei-me grande fã de Frank Sinatra, acho que estou ficando velho.
Enquanto o Album não vêm...ouça: http://www.myspace.com/dylanmondegreen
e, se estiver perdido em Oslo, vá ao Café Mono no dia 18, para conferir o moço ao vivo

Entrevistão- Bazar Pamplona (São Paulo)

Photo: Divulgação

Por Fernando Niero

Bazar Pamplona é uma das bandas mais jóia da atualidade: Com 1 album, alguns eps, bom instrumental e letras (ins)piradas, os rapazes prometem. A simpática trupe (Rodrigo Caldas - Bateria/PercussãoRafael Batata - Baixo/OutroEstêvão - Guitarra/VozJoão Victor - Guitarra) cedeu uma entrevista exclusiva ao Último Número. Sem mais delongas,vamos a ela:

O Último Número-(pergunta cliché número 1) por que Bazar Pamplona?

Resposta à pergunta clichê número um: por que não Bazar Pamplona? Precisávamos de um nome. Na frente do "Bazar Mil Cores" (é esse o nome, juro), na rua Pamplona, houve uma associação de palavras. Ficou o nome. Detalhe: quando surgiu, a banda não existia ainda. Moravam o Estêvão e o João Victor na Paulista. Hoje, moramos, por uma mera coincidência, na esquina da Pamplona com a Jaú.

O Último Número- qual a inspiração pras musicas? Lsd? ayuhasca? caminhadas por São Paulo?Devaneios, etc?

Drogas não funcionam como inspiração para as músicas. O Estêvão, por exemplo, é o maior careta do planeta: não bebe uma gota de álcool, choppinho nenhum, nada. Não fuma também. Enfim, um mala. As inspirações estão em todos os lugares: em alguma frase dita sem querer, em coisas que acontecem no dia-a-dia, em filmes, programas de TVs, livros, outras músicas etc.

O Último Número-as influencias de vocês são notadamente sessentistas, como foi a formação musical de vocês?

São notadamente sessentistas? Não sei. O Estêvão começou ouvindo Nirvana. Depois ouviu algumas bandas punks, até descobrir os Beatles. Depois tudo mudou. Vieram os Mutantes e os tropicalistas. O João, que é o mais novo da banda, começou ouvindo - pasmem - Oasis. O Caldas já é dos anos 80. Gosta de Smiths. O Batata anda ouvindo Gwen Stafani. O Capanema outro dia estava cantarolando Sean Lennon. Mas todos amamos Beatles, deve ter um pouquinho de influência. Entendemos sua opinião sobre o sessentista. Mas, pra gente, é muito difícil descobrir as influências no som do Bazar. Nunca planejamos: vamos fazer um som Mutantes. Montamos a banda e saímos tocando, sem dizer: vai ser assim ou assado. Deu no que deu. A proposta nunca foi imitar ninguém. E não condenamos quem monte uma banda para fazer um som Pavement ou fazer algo na linha Charlie Brown. Quer dizer, na linha Charlie Brown, nós condenamos. Mas, na nossa opinião, o legal é fazer coisas sem se preocupar com o que pode parecer.


O Último Número- como foi gravar o clipe de "As Nuvens Não Têm Playground"? de quem são aqueles textos?

O clipe foi assim: o Estêvão ficou duas semanas desempregado. Como não tinha nada de útil para fazer, compôs a música e a gravou num take só, voz e violão. Depois teve a idéia de fotografar o banheiro, fazendo desenhos nos azuleijos. O clipe foi todo feito de madrugada, pois, sem a luz do sol, a imagem da câmera tosca ficava meio alaranjada, meio envelhecida.


O Último Número-Empregos fora o Bazar...

O João é radialista, o Caldas e o Batata são analistas de sistemas e o Capanema e o Estêvão são jornalistas. Infelizmente, ninguém vive de Bazar Pamplona...

O Último Número- as letras são uma características forte da banda..quem as escreve?

Por enquanto, o Estêvão faz as letras. Mas, em breve, o João vai terminar a música dele sobre camisetas de manga comprida. Devemos tocar também uma música instrumental do Capanema, do projeto solo dele, o Pão Tonto. No futuro, esperamos que as músicas sejam mais coletivas.
Ainda sobre as letras...não vemos nada de mais, elas são muito simples. É que não sabemos falar difícil. E já percebeu que bandas que falam difícil são chatas? Nós achamos...


O Último Número-e contem direito essa história do Paco e o "Vocês têm afinador? Então por que não usam?" (Paco Garcia=guitarrista boa-praça do Los Pirata)

Foi a primeira vez que conversamos com o Paco pessoalmente. Fomos chamá-lo para produzir nosso primeiro disco. Ele tinha ouvido gravações caseiras e de ensaios. Tocávamos muito mal na época. E era tudo desafinado mesmo. Ele disse a frase na maior seriedade, numa mesa de padaria. Foi direcionada ao João Victor. E, sim, ele ficou constrangido na hora.

O Último Número- Como é ter o menor Blog da terra? (Nota do editor: http://www.bazarpamplona.blogspot.com/

Então, o menor blog da Terra quase nunca é atualizado. Foi abandonado. Não temos mais tempo (e saco) para atualizar aquilo. Mas um dia pode voltar, quem sabe.

O Último Número-A Karen Cunha Já devolveu o Pet Sounds? (referência à canção "Recado para Karen Cunha, sobre uma garota que pegou o citado album emprestado e ficou com ele pra sempre)

Karen Cunha não pode devolver o CD. Vamos supor que ela devolva. O que vai acontecer com a música? Teríamos que apagar todas as versões que existem por aí espalhadas por meia dúzia de computadores de gente que teve o mau gosto de baixar nosso som. Perde o sentido...

O Último Número-e os Planos de Dominação mundial? (proximo album, shows, propostas milionárias de gravadoras, etc)

Foi bom que você tenha tocado nessa questão de dominação mundial. O problema que vemos nas bandas de hoje é que elas se acham muito boas. Não que você não possa ter a ambição de erguer sua banda dentro de um cenário e de acreditar naquilo que está fazendo. Pode até ter, e deve acreditar no próprio som, mas é preciso ter pé no chão. Primeiro que música não é e nunca vai ser competição. Porque sempre vai ter todo tipo de música para todo tipo de gosto. Agora, se um cara de banda te disser: "nós somos fodas, vamos dominar o mundo, nosso disco é pura poesia", desconfie. Porque eles não são fodas. São um bando de medrosos tentando se reafirmar o tempo todo. E está cheio de gente arrogante dizendo isso por aí. Tampamos os ouvidos para essas pessoas. Não queremos saber dessas pessoas. Mas voltando: como não sai nunca o primeiro disco, talvez ele seja liberado na internet mesmo. Estamos tocando músicas novas, e o segundo disco já está embicado. Vamos gravá-lo aos poucos, em casa. Será caseiro, diferentemente do primeiro. Por isso, acho que vai ficar cada vez mais nonsense. As músicas estão ficando diferentes e, na nossa opinião, melhores. Pretendemos lançar o disco antes que o ano acabe.
Se acaso quiseres Ver: www.fotolog.com/bazar_pamplona
Se acaso quiseres adentrar o sítio oficial: www.bazarpamplona.com.br/
Fernando Niero tem 23 anos e é editor dessa revista

Carollina Lauriano- Crônicas de uma vida (quase) moderna.

Não é tarefa fácil ser sozinha em uma cidade grande.Tinha acabado de comprar uns livros e não queria voltar imediatamente para casa. A temperatura estava amena e no céu um azul intenso. O pôr-do-sol estava próximo, o azul do céu já começava a se misturar com o alaranjado do sol; fazia muito tempo que não tínhamos um dia bonito assim.Resolvi sentar num desses barzinhos, que tem mesinhas espalhadas pela calçada, para beber algo enquanto apreciava àquela paisagem.
- Moço! Moço!
- Pois não senhorita.
- Estou aqui a mais de 10 minutos e ninguém veio me atender.
- Pensei que a senhorita estava esperando alguém.
- Não! Estou sozinha. É alguma aberração uma mulher sentar sozinha para beber algo em um bar? – naquele momento o azul alaranjado do céu já havia se tornado uma imensidão acinzentada informando que tinha tempestade a caminho.
- Claro que não – o pobre do garçom tentando contornar a situação.
- Pois bem, então porque fiquei aqui plantada por vários minutos até ser atendida involuntariamente por você – nessa hora eu já devia estar querendo arrumar algum tipo de confusão gratuitamente.
- O que a senhorita vai querer?
- Desisti. Não quero nada, vou para casa.
Joguei os livros no sofá e sentei-me na velha poltrona vermelha que, estrategicamente, dava para a varanda. Acendi um cigarro.Eu, que havia parado de fumar, sempre carregava na bolsa um maço de cigarros para eventuais emergências e/ou recaídas repentinas. Não devo ter muito amor próprio, e, o pouco que tenho, ainda tentam extinguir.

Regis Ribeiro: Escute este Texto (ou “Livros, fotocópias, cadernos, marca-texto e mp3” 2.0)

Banho, roupa, café da manhã, ônibus.

Trabalho, trabalho, e-mails, trabalho, fadiga, ônibus


Leituras, leituras superficiais. Músicas, leitura auditiva, superficial?
Não.

No texto, marcas fosforescentes. No contexto, confusões causadas por definições desestruturadas. Confusões divertidas, legais, que não nos atrapalham onde realmente (realmente) importa ou não.

Música. Alegria, felicidade. Preocupação. Textos. Dúvidas, desânimo, sono, euforia, incompreensão. Incompreensão igualmente divertida, as quais aprenderemos que não nos atrapalha, mas que precisamos incompreender.

Música, certeza, chatice, pula, alegria. Ou talvez não. Impaciência, pula. Muda o texto, muda a música..

Descanso.


Universidade, aula, questionamentos. Culpa, textos mal lidos, músicas mal ouvidas. Textos maus, música má.
Amigos, risos, confissões, abraços. Músicas? Não...
Ônibus, metrô, despedidas, trem.
Trem, músicas, textos, pensamentos, suposições. Análises, considerações, mentalizações. Bateria fraca.


Conseguimos estruturar um pensamento, mas isso acontece bem na hora que começa aquela música de melodia perfeita, e o volume é aumentado, enquanto a concentração é diminuída, mas aumentada pra outra coisa.

A rotina, assim, prossegue. Mas não de forma rotineira, justamente por causa dos textos e das músicas, das apreensões e das cantaroladas com as músicas e com os textos. Quebrar a rotina, a mesmice, talvez seja a missão da combinação textos-música. Combinação oportuna, convenha-se, mas que traz conseqüências, como qualquer outra coisa consequencial. Talvez não chegue a tanto, mas o que importa é que nos fazem existir metafisicamente, quando nos dá a chance de pensar descontroladamente, misturando conceitos teóricos com batidas de bateria, com meias-luas e notas de rodapé. Nos faz perceber o quanto somos coisa alguma.

Mas, de alguma forma, quando um atrapalha a compreensão do outro (usando atrapalhar aqui como uma coisa nem boa nem ruim, mas simplesmente atrapalhadora (e esse “atrapalhadora” também não significando algo bom, ou ruim)), acabam se completando, porcamente, claro, como tudo. E o que entenderemos daí será o que seremos, mais (sim, mais adverbial) na verdade o que quereríamos ser, ou o que queremos que sejamos, ou será a maneira como entenderemos as coisas. A origem diversa dos textos, e das músicas, e nossa capacidade de não entender coisa alguma, associada ao pedantismo consciente (não o pedantismo malvado, aquele inconsequente; mas o pedantismo que usamos para ao menos entender provisoria e superficialmente as coisas, até que aquele pensamento ou visão se consolide na nossa cabeça ou caia fora de uma vez. Enfim, a nossa filhadaputice metodológica), e às nossas conclusões não conclusivas, nos farão possíveis compositores fracassados, péssimos alunos, leitores frustrados de blogs, viciados na superficial rede eletrônica mundial, profissionais inaptos ao mercado (olha, uma coisa legal!), nerds (sim, porque de alguma forma, conseguimos ainda manter médias exibíveis. Ou não...) e levaremos nossos cursos nas coxas, ao mesmo tempo que nunca conheceremos bandas como deveríamos conhecer, o que pode ser bom, ou ruim.
Ou os dois.

Mas o que realmente interessa: Alguém realmente quer conhecer a fundo a origem do Indie Funk Curitibano ou a Teoria Geral das Ciências?

Paulo Trani- a vida em um supermercado

Cansado e fatigado perambulando por ruas atônitas. Cambaleando em sonhos e bebidas pelo asfalto. Carros. Motos. O negro da rua e da noite fundido-se e se transmutando em incansáveis luzes artificiais da calçada. As pessoas passam e as vezes sorriem sem saber ao certo por que caminhos levarão seus passos. Irei agora ao mítico supermercado e suas luzes incandescentes. Irei caminhar ao suave deleite das prateleiras iluminadas. Do chão branco e da sessão dos legumes. Os caixas e todas as coisas parecem tão típicas daquele lugar como se a cidade e os supermercados sempre tivessem existido. Fazem-se promoções e cartazes. A crueldade disfarçada-explícita que parece te enforcar a cada passo em território iluminado de luzes brancas na qual finge-se que se comporta como se algo existisse para fingir e para se ocultar em prateleiras. Os patins. Refrigerantes talcos produtos de limpeza que precisaremos para contentar-se e sorrir. Conforto em apartamentos encarpetados. Enfim uma vida. Fala-se em dinheiro e descontos. As esteiras rodam e as compras passam por um bip. Poderia morar e enlouquecer em um supermercado.